Cenas Culturais

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terça-feira, 22 de abril de 2014

Reflexões sobre o Teatro paulistano



     Eu vou ao teatro desde pequeno, nos anos 70. Graças aos meus pais, fui apresentado ao teatro infantil. Era um programa de final de semana irmos às peças infantis. Também quando estava de férias, ia bastante. Assisti à várias peças - devo ter visto todos os contos de fadas e inúmeras montagens de "Os Saltimbancos", de Chico Buarque.

     Lembro-me de também participar das peças, que quase sempre tinham a participação das crianças - os personagens pediam ajuda para realizar alguma tarefa. Nesta parte, nunca fui tímido. Se tinha que subir no palco, era comigo mesmo (algo que dura até hoje, inclusive por isso, fui fazer o curso de teatro - acho que é um desejo de ser artista, não concretizado).

     Com o passar dos anos, a ida ao teatro só aumentou. Foram tantas peças, que deveria ter guardado todos os programas para recordar. Meu primeiro musical adulto, que me lembro (e guardo no coração) foi a montagem de 1981 de "Ai vem o Dilúvio", no teatro Sérgio Cardoso, com Luiz Carlos Clay, Vivian Costa Manso e Silvia Massari, entre outros. Depois vieram "Evita", com Cláudia e Elymar Santos; "Piaf", com Bibi Ferreira, ambas as peças na antiga casa de shows - Palace, e por aí vai.

     Também via peças não musicais. Havia as antigas companhias de teatro, como a do Antônio Fagundes e da esposa, na época, Clarice Abujamra, que criaram a Companhia Estável de Repertório - CER, e que apresentaram as peças "Xandu Quaresma", "Cyrano de Bergerac" e "Nostradamus", entre outras, sempre no Teatro Cultura Artística (fechado desde 2008 por causa de um incêndio); e a do Teatro do Ornitorrinco, de Cacá Rosset, Luiz Galizia e Maria Alice Vergueiro, que encenaram "Ubu - Folias Physicas, Pataphysicas e Musicaes", "Teledeum" e "O Doente Imaginário", etc; entre outras;

     Também pude assistir textos encenados por Marília Pera, Fernanda Montenegro, Cleide Yáconis, Paulo Autran, Armando Bogus, Antonio Grassi, Irene Ravache, Marcos Caruso, Jandira Martini, Jussara Freire, Esther Góes, Renato Borghi, Walmor Chagas,...
     
     Mas parece que foi um outro tempo. Tempo este que ficou no passado e que me faz questionar algumas coisas do porquê desta mudança.

     Duração - Por que antigamente as temporadas duravam mais? As peças de sucesso ficavam por meses. "O Mistério de Irma Vap" ficou onze anos em cartaz e "Trair e Coçar é só Começar", está sendo encenada desde 1986. Agora uma peça faz sucesso com apenas dois meses em cartaz! E antes, as peças eram apresentadas de quarta a domingo; sendo que agora é só de sexta a domingo.

     Não se pode dizer que é porque temos mais ofertas de lazer atualmente, pois o único atrativo a mais que apareceu, com o passar dos anos, foi a internet. Ou seja, o teatro sempre concorreu com televisão, cinema, shows e restaurantes, entre outros.

     Os musicais também fazem temporadas de só três meses. Se você não conseguir vir para o eixo Rio - São Paulo rapidamente, após a estréia destas peças, perdeu. Não as verá mais. Será que ter uma temporada por um tempo maior é tão difícil assim?

     Sub-produtos - As peças musicais faziam as gravações das músicas da peça e vendiam para o público. Devo ter em algum lugar ainda a fita casseteee da peça "Ai Vem o Dilúvio". Muitos adultos devem ter tido o LP da peça "Os Saltimbancos". Lembro-me do LP da peça infantil "Mônica e Cebolinha no Mundo de Romeu e Julieta" (que foi reencenada em 2013), que vinha com um encarte para recortar e brincar de teatro com os personagens. Além das gravações de musicais, que estrearam por aqui, nas décadas de 60 e 70, como "Hair", "Jesus Cristo Superstar" e "Rock Horror Show" (e que podem ser encontrados na internet).

     As montagens da Broadway costumam excursionar pelos outros estados norte-americanos, além de ter montagens em outros países, e em outros idiomas. Sabendo do público que têm, lançam os cds com as gravações das montagens, tanto no idioma inglês, quanto no idioma do país onde está sendo montada a peça. Além disso, licenciam as peças para serem feitos cadernos, mousepads, canecas, jogos, bonecos, e depois venderem estes produtos nas lojas localizadas dentro dos teatros. Com isso, aumentam a receita.

     No Brasil, basicamente tirando dois musicais em cartaz - "Vingança" e "Todos os Musicais de Chico em 90 Minutos", não se tem a gravação e venda dos cds das peças. Se somos o terceiro maior produtor de musicais no mundo, será que não é indício que tem mercado suficiente para comprar os cds com as músicas da peça?

     Quanto as lojas com os souvenires, destacamos os trabalhos da "A Loja dos Musicais" e a loja do Teatro Renault. "A Loja dos Musicais" é uma empresa independente que não está vinculada a um musical específico e costuma estar presente nas principais peças, vendendo seus produtos (está se preparando para começar a venda online). O Teatro Renault tem no seu saguão, um espaço para vender os itens com a marca dos musicais que apresenta. Mas e as outras tantas montagens? Como fica quem quer levar uma lembrança peça que acabou de ver e gostou?

     Preço - Antigamente, ir ao teatro era um programa de família, e podia ser feito com uma certa regularidade. Depois, costumava-se terminar a noite em uma das várias pizzarias paulistanas.

     Só que agora, virou uma opção de lazer proibitiva. Se a peça não for um musical, costuma ficar na faixa de setenta reais por pessoa. Quando é musical, este valor vai para duzentos reais (tomamos como exemplo, se for escolhido um lugar de boa visibilidade, mais próximo ao palco).
Se por acaso, uma família de pais e dois filhos for ver um musical, gasta em média seiscentos reais! - com ingressos, estacionamento, pipoca e refrigerante. Isto sem a pizza após o teatro (que também aumentou muito de preço atualmente).

     Com isso, como opção para poder reduzir os gastos, as pessoas usam carteiras de estudante. Os produtores de teatro dizem que com o advento destas carteiras, houve um aumento nas vendas de ingressos de meia-entrada, sendo que as vezes, chegam a ocupar cerca de 80% da sala.

     Lógico que com a fácil obtenção de carteiras de estudante, as pessoas usam deste subterfúgio para poderem ir ao teatro. Com isso, os produtores fazem suas planilhas de custo e colocam o que era para ser o preço inteiro como sendo o preço da meia entrada, e quem não tiver carteira de estudante, acaba pagando o dobro do que deveria.

     Mas sabe-se também que há uma oportunidade das montagens conseguirem verba através de incentivos governamentais; quando não, por meio de patrocínio de grandes empresas. Nas montagens da década de 80, quando duravam meses, a bilheteria pagava o espetáculo. Então, como podemos repensar o valor, para permitir novamente o acesso da população ao teatro?

     Esperamos que o teatro possa voltar a ter o apelo que tinha. Nada melhor do que ver, ao vivo, a história se desenrolar na sua frente. Perceber através dos gestos, da respiração, das expressões faciais, o que cada ator tem pra contar. Nada mais excitante do que quando a cortina se abre e somos transportados para uma outra dimensão. Dimensão essa que só é atingida pessoalmente estando sentado na platéia. 

     Vá ao Teatro!

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